| O número de processos por erro médico   recebidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) mais que triplicou nos   últimos seis anos. De 2002 até o fim do ano passado, o volume de ações passou   de 120 para 398, segundo a assessoria de imprensa do tribunal. No total,   tramitam no STJ atualmente 471 casos, a maioria questionando a   responsabilidade exclusiva do médico e não das instituições. Para médicos de   entidades que acompanham o problema, o avanço das denúncia revela, em parte,   que os brasileiros estão mais conscientes de seus direitos. O Conselho   Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) admite, porém, que a   má-formação profissional dos médicos e a falta de condições de trabalho   também estão por trás das estatísticas. 
 Lígia Bahia, médica e vice-presidente do Centro Brasileiro de Estudos de   Saúde (Cebes), do Rio de Janeiro, chega a dizer que não houve aumento na   incidência de casos, mas sim uma evolução da população brasileira, que está   mais consciente e vem perdendo o medo de denunciar. "Os erros médicos   não aumentaram, o que aumentou foi o registro, e isso é positivo porque quer   dizer que a sociedade está mais transparente", avalia. Para ela, vem   ocorrendo uma mudança na relação entre o médico e o paciente, que no Brasil   sempre foi muito "liberal", com o médico "acima de qualquer   suspeita". O ideal, diz ela, é que a relação seja institucionalizada
 
 Mesmo com o aumento das denúncias por parte da população, a estatística ainda   está muito aquém da realidade, na opinião de Lígia Bahia. "No Brasil há   um sub-registro de erros médicos, a gente só vê a ponta do iceberg, não temos   dimensão do iceberg inteiro". A vice-presidente do Cebes explica que as   ocorrências não chegam a ser registradas muitas vezes por falta um sistema   nacional de regulamentação técnica. "No Brasil temos péssimos   prontuários, os registros da enfermagem não são padronizados, o diagnóstico   muitas vezes é passado oralmente, e não por escrito, e assim não é possível   provar que houve erro médico". Ela também acrescenta que a alta   rotatividade dos profissionais da saúde, como enfermeiros e auxiliares,   dificulta o registro das etapas do tratamento do paciente
 
 Como exemplo da falta de transparência, ela cita o caso da dona de casa   Verônica Cristina    Barros, que morreu na manhã de sábado no Rio de Janeiro.   "O marido da vítima foi comunicado do suposto erro médico por meio de   uma ligação anônima", lembra. Depois de cair e bater a cabeça, um   coágulo se formou no lado esquerdo do cérebro de Verônica, conforme indicou   tomografia computadorizada mas a equipe médica teria operado o lado direito   da cabeça da paciente.
 
 Formação profissional
 O Cremesp também verificou um crescimento no volume de denúncias. Segundo o   médico e vice-presidente da entidade, Renato Azevedo Junior, com base nos   últimos dados, de 2006, houve um aumento de 75% em relação a 2000. Azevedo   também vê nos números um sinal de que a população é hoje mais consciente de   seus direitos e denuncia mais. Para ele, esta mudança de comportamento é o   principal motivo do crescimento dos processos. Mas ele também destaca a   má-formação profissional, por conta do aumento das universidades de medicina,   muitas delas despreparadas para oferecer o ensino adequado
 
 Ele cita ainda as condições de trabalho. "Principalmente na periferia, o   médico não tem condições de exercer sua profissão de forma adequada, não tem   material, não dispõe de exames", aponta. Para o vice-presidente do Cremesp,   a baixa remuneração também compromete a qualidade do profissional.   "Hoje, os médicos do serviço público trabalham em média de 10 a 12 horas diariamente, e   assim o profissional não tem tempo de se atualizar.
 
 Para a advogada e presidente da Associação das Vítimas de Erros Médicos   (Avermes), Célia Destri, o aumento no número de processos evidencia a   qualidade da formação do médico, que ela classifica como "péssima".   A entidade acompanha mais de mil processos sobre erro médico. Segundo a advogada,   em cerca de 70% dos casos julgados o paciente foi indenizado. Célia fundou a   primeira entidade de assistência a vítimas de erro médico em 1990. Ela conta   que perdeu o rim esquerdo numa cirurgia ginecológica para retirada de cistos   no ovário. Durante o procedimento, ela teve o ureter, canal que liga a bexiga   ao rim, cortado por engano. Durante dois dias, conta, sentiu cólicas, que a   médica diagnosticou como "psicológicas". Operada às pressas, a   equipe médica encontrou dois litros de urina na em seu abdome
 | 
 
Comentários