Tribunal contraria jurisprudência ao negar cirurgia a beneficiário de plano



O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negou ao beneficiário de um plano de saúde o direito de realizar uma cirurgia prescrita pelo médico que não estava prevista na cobertura do serviço contratado. A decisão contrariou a jurisprudência construída pelo TJSP... 

Segundo a sócia do Raeffray Brugioni Advogados, Ana Paula Oriola de Raeffray, defensora da empresa de assistência médica vencedora do processo, o juízo abriu um precedente importante para a melhoria do ambiente de negócios no ramo de saúde. "Em geral, tanto o TJSP quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) dizem que se há prescrição médica, o plano tem que cobrir", afirma ela. 

A ação chegou à Justiça com a reclamação de um segurado contra seu plano de saúde que recusava cobrir uma prostatectomia radical por videolaparoscopia robótica. Na primeira instância, foi julgado procedente o pleito do paciente, de modo que a administradora do plano foi obrigada a dar cobertura ao procedimento, além de pagar uma indenização de R$ 12 mil por danos morais. 

Inconformada, a seguradora apelou da decisão, argumentando que o procedimento foi autorizado, mas sem a técnica de robótica, que além de não estar prevista no contrato também não consta na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). O relator da ação no TJSP, desembargador Teixeira Leite, entendeu que ficou claro que a cirurgia robótica não é o único procedimento possível para a cura. 

"Assim, métodos mais caros devem ser custeados pelo segurado, sendo sua a opção quanto a estes benefícios", destacou o relator no acórdão. 

Na opinião da advogada, o entendimento do TJSP pode reduzir o volume de reclamações por exclusão de cobertura. Segundo ela, por conta da crise, muitas pessoas estariam se aproveitando do Judiciário para receber tratamentos mais caros do que os previstos em contrato. "A conta da obrigação [imposta na Justiça] é paga pelos demais participantes do seguro", avalia. 

O sócio do Rosenbaum Advogados, Léo Rosenbaum, admite que por causa da crise, quem nunca tinha entrado com ação por medo, hoje discute seus problemas no Judiciário com muita frequência porque sabe que na maioria dos casos vai ganhar as suas ações. "O trabalho dos advogados aumenta em épocas de recessão, porque muitas pessoas, já que não conseguem liquidez pelas vias normais, acabam tentando se beneficiar do Judiciário", comenta. 

De acordo com pesquisa divulgada pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, de 2010 a 2014 foram julgados em segunda instância pelo TJSP 37.609 processos relacionados a planos de saúde. Só na comarca de São Paulo, de 2013 a 2014, foram gerados 4.059 acórdãos. Em 92,4% deles, foi dado o ganho de causa ao consumidor. 

O fenômeno se vê também fora da iniciativa privada. Segundo dados do Ministério da Saúde, de 2010 a julho de 2016 houve um aumento de 727% nos gastos da União com ações judiciais para aquisição de medicamentos, equipamentos, insumos, realização de cirurgias e depósitos judiciais. 

Constituição 

O motivo dessa aparente predileção da Justiça pelo beneficiário, na opinião de Ana Paula, é que a jurisprudência brasileira é mais "principiológica", colocando os preceitos afirmados pela Constituição Federal acima dos contratos. "O artigo 196 da Constituição diz que a saúde é de direito de todos e de obrigação do Estado. O contrato é a lei que existe entre as partes, mas o valor é visto como mais importante do que a lei", explica. 

Já Rosenbaum esclarece que em casos relacionados a saúde, a norma que rege o Código de Defesa do Consumidor (CDC) de que em caso de dúvida a decisão deve ser favorável ao consumidor é muito usada. "Se existe alguma limitação no contrato com relação a um tratamento para questão de vida, essa cláusula é considerada abusiva à luz do CDC." 

Na opinião de Ana Paula essa visão de que o consumidor é hipossuficiente em relação ao plano de saúde não deve ser generalizada. "A pessoa não é ignorante em relação ao rol de procedimentos cobertos pelo plano. O beneficiário tem condições de saber que tipo de cobertura possui. O que não dá para fazer é comprar um fusca e esperar receber uma Ferrari." 

Rosenbaum ressalva que apesar dos frequentes abusos, a jurisprudência está correta em afirmar que quem determina o melhor tratamento é o médico e não o juiz. 

Ricardo Bomfim

DCI - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS

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